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Pausa para o silêncio


Viver no meio polêmicas encadeadas, parece nos obrigar a ter opinião sobre toda novidade: é preciso ser especialista em qualquer área, a qualquer tempo. Como psicóloga, me sinto constantemente convocada e por isso também exausta, correndo sempre atrás do tempo que já passou por mim. Quando um novo assunto surge, ainda nem tive condições de analisar a última notícia.


Para que a sensação de atropelamento- por-um-trem-bala não seja constante, foi importante aprender a diferenciar os assuntos que se relacionam diretamente comigo, dos assuntos importantes para o trabalho e ainda os outros (tantos) acontecimentos que orbitam em torno de todos nós.


A falsa necessidade de ser especialista de tudo me faz andar na superfície dessas órbitas, sem nunca completar um giro. Escolher um dos lados da história, que se situam, por vezes, em extremos opostos, me obrigando a reproduzir o pensamento do dualismo cartesiano, ultrapassado e insuficiente para nossas vivências plurais e complexas. Na contramão do barulho ininterrupto, dos excessos e da pressa, penso que podemos defender o espaço do silêncio e da pausa. Antes de devolver ao mundo isso ou aquilo, nem um nem outro: respiro.

Posso permitir que pensamentos sejam só pensamentos.

Para sair do estado de alerta, é preciso pausa e silêncio. É necessário se afastar dos estímulos constantes e se permitir sentir com mais atenção e menos julgamento.

Refinar a escuta de si mesma e acolher os desconfortos que inevitavelmente surgirão e que nos acostumamos a calar com drops de adrenalina que as polêmicas nos trazem. Quando quebramos o ciclo de busca por pequenas recompensas e suportamos o estado de pausa e silêncio, construímos autonomia e liberdade. Experimentar a vida com responsabilidade, presença e carinho. É como abrir janelas do tempo para aprender melhor, treinar a habilidade de repousar sobre os próprios pensamentos e ressoar os efeitos dos acontecimentos, sem responder de modo reflexo à eles. Perguntas como 'o que está acontecendo comigo agora?'; 'como me comporto diante disso?'; 'o que quero fazer?'; 'preciso reagir diante disso?', ajudam a quebrar uma resposta automática em pedaços menores que podem caber no espaço que você abrir.


"Talvez porque o silêncio traga consigo o deslumbramento, mas também porque traz uma certa majestade em si, como um mar ou uma infinita planície nevada. E quem não se deslumbra com essa majestade tem medo. Na verdade, é por isso que muitos tem medo do silêncio (e é por isso que temos música como pano de fundo em tudo, por toda a parte)" (Jon Fosse)

O silêncio nos faz conseguir ouvir o que é abafado pela confusão do dia a dia. Produzir hábitos de cuidado com pausa e silêncio pode ser uma importante estratégia para lidar com a fragilidade e constante exposição à barbárie que estamos vivendo. Dissolver as respostas reativas em defesa do uso do próprio tempo com devoção à ética da vida e dos afetos. Decantar no silêncio com respeito à lentidão que os processos internos necessitam, em oposição ao caos negligente imposto pelos nossos tempos.




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